O olhar do anão
A partir do quadro Retrato de Sebastián de Morra (1645), de Diego Velázquez
O olhar alto desse anão não se abaixa.
(Se engana quem acha que é dele rei).
Roupa nobre em corpo pobre não basta –
mentira na casca só cobre a tez.
No caroço que o fez torto, talvez,
sol de espelho onde o seu outro descansa.
Lá, bem longe do reinado que o fez
engraçado, uma raiz nada mansa.
Nela um homem firme fica à distância.
O outro dança, e ele se assiste do escuro.
Sob o palco, solitário e sem ânsia,
vê mais claro e tudo encara, seguro.
Segue alto, ainda que o olhem de cima.
Erra o riso ao encontrar nele rima.