Aula na praia
A minha mãe
Naquela sala de aula além da escola,
o piso era a praia de Periperi,
as paredes pairavam infinitas
e o quadro-negro era o azul do mar.
Os meninos e meninas se sentavam na areia
e aguardavam a aula começar.
O som das vozes se esvaziava no vento.
O silêncio ali tinha som de ondas calmas.
O suor do sol soletrava fachos de luz lenta.
Não havia giz. Não havia lápis. Não havia letras.
Pondo a mão sobre as sobrancelhas,
a professora sombreou os olhos.
Sua vista gasta atravessou vidraças grossas
de paralelas janelas gêmeas, em dourados aros.
Mirou o horizonte, como quem sabe ler o longe
e apontou um ponto branco, luz no meio do mar,
um barco a vela – chama que nos chamava a atenção.
Nosso olhar seguiu o seu dedo mestre,
enquanto a sua voz suave nos ensinava o simples:
“Vamos observar o barquinho. Aos pouquinhos ele vai sumir.”
E assim seria.
O vento soprava a vela no azul daquele quadro
e a água ia apagando o barco…
Pois a quem fica a ver navios e barcos a vela se pondo
no abismo, como o sol após as seis,
toda linha reta é curva.
O barco apagado não havia afundado,
mas escorregado na curva da esfera.
Pois assim é e era, redonda, a Terra.
(E quem some segue sendo em passeios pelo círculo.)
Eu era um desses meninos.
E essa mulher era minha mãe.
Além-mãe, além-mar,
do outro lado do abismo,
da beira da ilha onde moro,
tento avistar essa praia.
Mas toda linha reta é curva,
turvando o alcance da vista.