Um quarto em quatro luas

3º lugar no XXXVIII Concurso Literário Felippe D’Oliveira
Edição 2015, Santa Maria-RS

I – Quarto crescente

A lua é só um risco
que reconhecemos juntos,
um traço sobre a vidraça
do quarto que mal conheço.

E nessa esfera em formação,
a promessa de sóis noturnos
penetra o quadrado do quarto,
canteiro onde cresceremos.

Abraço-te e o breu se acende,
pois o teu corpo me prende.

II – Quarto cheio

A lua atravessa a vidraça do nosso quarto
e não se corta.
Nossos corpos,
rios de sangue em leitos paralelos,
se confluem.

A noite dorme do lado de fora
e se derrama sobre nós.
Enlaçados um ao outro,
corpo a corpo,
quase almas,
nós ainda bocejamos.

Entre nós,
o silêncio, que a tudo segue, se infiltra
e vai cegando as falas, as sensações, os sentidos…

Sobra o sabor das bocas –
em cada boca,
o sabor da outra;
e o paladar de peles,
que só se apaga aos poucos.

III – Quarto novo

A lua filtra a luz de outro astro
e fura a vidraça de um quarto
onde tudo parece novo.

Esse silêncio entre nós não é mais a paz do após a sós,
mas o próprio embaraço de já nos sabermos sós.

Silêncio,
língua falada entre amantes
quando o amor perde a voz –
língua falada entre nós.

IV – Quarto minguante

A lua partiu a vidraça
do quarto de onde parto.
A noite mal começou,
mas já penetrou o quarto.

Lá fora acenderam as luzes.
Em mim tudo escureceu.

Acostumado à chama,
até segurei tua mão.
Mas nada clarearia
o escuro do coração.

Ao sair,
sorri,
reverberando saudades,
como quem ergue o braço
e deixa um adeus no ar…

Mas não te dou adeus,
te empresto.
Se esse é o fim da festa,
vou deixar frestas abertas
a improváveis voltas.